Thursday, June 23, 2005

vejo o nada

Enfim não é apenas mais uma dúvida, mais uma indagação obtusa ou mais uma especulação idiota, enfim agora eu sei ... agora eu sei - sou cego. Sim, cego - a miopia não passou de um prognóstico falso.

E agora me espanto e rio até - quantas vezes me perguntei qual era então a cor da meia que vestira aquele dia, ou se já era noite o dia escuro!!! Quantas!!! Inocente- a cegueira já era total, e mal eu sabia que esses olhos já não valiam para nada.

Tenho que dizer, porém, que, SIM, JÁ ENXERGUEI UM DIA. Poucas vezes, confesso, mas enxerguei. Talvez aquele dia após um bom e gelado banho numa tarde de verão, eu deitado sobre o lençol macio, imberbe, livre, limpo fitando a mim mesmo e àquela imagem numa contemplação contente. Ou talvez naquela viagem, madrugada fria, chuvosa, eu no carro enrolado com uma manta fina, observando, contenplamdo - contente. Era quando enxergava aquilo tudo...
...e não só com os olhos - mas com o corpo, todas aquelas cores, texturas, formas, sentindo, olhando, gravando... aquela tênue imagem de felicidade.

Com o tempo, esses olhos que ainda tenho já não me prestavam mais, quando eu já não corria mais atrás de carrinho de corda ou pulava de galho de árvore. A infância tinha passado, os amigos de meninice estavam longe e a única coisa que eu me animava a fazer era ficar parado. Inerte perdendo tempo e pensamento com os castelos que o futuro me traria ou os prazeres que logo teria. Tempo perdido. Por mais entusiasmado que tente estar a única coisa que consigo sentir e gritar é " não valeu para nada". Estava eu na completa obscuridade e o pensamento perdido em qualquer lugal.

Os anos passaram e os castelos sederam lugar para os textos nunca escritos, as pinturas sem cores, as peças mudas... enfim, os milhões de lapsos criativos que nunca sairam além do vazio da minha cabeça. E a cegueira continuava a mesma.... O mundo com todas as suas formas já estava esquecido na minha rotina de cego e a mente viciada no ópio do meu próprio e inútil mundo. Vida inerte, inamimada e perdida - nem feita, nem vista.

Contudo, ainda que me chegue por apenas alguns segundos raio de visão, posso ter certeza de olhar para mim e ver apenas escuridão.

Quero enfim, que a minha mente esteja vazia como sempre deveria estar.
Que a minha criação se conclua, ou que a criatividade não mais exista.
E quero muito, contudo, que meus olhos estejam bem cheios... cheios de imagens, formas, cores, e de VIDA.

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Puxa bi...que tudo este seu texto!
Adorei visitar seu blog...virei sempre agora!! bjinhus

11:48 AM  

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